Por Mariana Baltar
Em ” Notas sobre a cultura somática”, Jurandir Freire Costa vai reavaliando as crenças e o papel relegado ao corpo na educação sentimental burguesa, para então mapear as mudanças que constituem a contemporânea cultura e personalidades somáticas. Com base em Peter Gay e Norbert Elias, resume desse modo os conjuntos de disciplinas que normalizaram o corpo e seus sentidos no contexto moderno de construção do homem sentimental: “As disciplinas sexuais visavam a moderar os prazeres sensuais de modo a drená-los par ao sentimentalismo amoroso, o cuidado com a família ou a sublimação artístico-científica. As intelectuais buscavam adequar os sentidos e a motricidade às exigências da cultura erudita: ler em voz baixa e de forma correta, escrever bem (…).
As higiênicas tinham por objetivo adestrar a visão, a audição, o tato, o gosto e o olfato, de modo a despertar nos indivíduos desprezo ou repulsa pela sujeira, feiúra e grosseria dos corpos mal-educados.(…) Por fim, as disciplinas de apresentação socialou regras de etiqueta ensinavam aos indivíduos como se vestir, andar, sorrir, sentar, receber convidados, conversar, dançar, cantar, tocar nutrimentos musicais etc. a fim de que o ‘ berço’ dos bem-nascidos fosse evidente à primeira vista” (p.207).
Pensando na dupla dimensão da pedagogia das sensações, bem poderíamos notar como cada uma dessas disciplinas responde correlatamente a um gênero (do corpo) institucionalizado ao longo do projeto de modernidade. Assim, as disciplinas sexuais correlacionam-se ao domínio da pornografia; as intelectuais, ao realismo; as higiênicas, ao horror; e as de apresentação social, ao melodrama. Forças análogas que respondem a uma sensibilidade comum, colocando os gêneros como instrumentos do projeto de educação sentimental. Dispositivos de uma pedagogia das sensações que alimenta e orienta tal projeto.
Parece um caminho a ser traçado, que tem a imensa vantagem de incluir o domínio do realismo no universo sensório-sentimental da pedagogia das sensações. Vejamos onde isso vai dar.