Ciclo de estudos: Tateando Afetos no Cinema Contemporâneo

Ciclo de estudos: Tateando Afetos no Cinema Contemporâneo

O NEX convida pessoas interessadas em se juntar para estudar o tema do afeto como categoria de análise para o cinema e audiovisual contemporâneo.

O ciclo de estudos vai acontecer nas terças de junho de 2022, das 14h30 às 16h30.

Os encontros serão presenciais, mas a depender do número de inscritos poderemos precisar fazer em modo online

Inscrições aqui

Período de inscrições: 9 a 15 de maio

    O ciclo de estudos pretende explorar e discutir os estudos acerca da dimensão sensorial e afetiva do cinema contemporâneo. Em cada encontro iremos nos aprofundar em um autor, seus conceitos e implicações que dizem respeito à ressonância afetiva produzida pela experiência fílmica.  

TEXTOS planejados:

7 junho

VIEIRA JR, Erly. Breves considerações sobre a sensorialidade na experiência audiovisual: Sujeitos cinestésicos, visualidades hápticas e ressonâncias carnais.  (s/d mimeo)

14 junho

Bezerra, Julio. A aurora do mundo: propostas sobre um certo cinema contemporâneo. Tese de doutorado, PPGCOM – UFF, 2013. (páginas 9 a 40)

21 junho

SOBCHACK, Vivian – Address of the eye. Princeton University Press, 1992. (Capítulo 1 “Phenomenology and the Film Experience”) 

28 junho

MARKS, Laura – The Skin of Film: intercultural cinema, embodiment and the senses. Duke University Press, 2000. (capítulo 4 + Conclusão – páginas 194 a 247) 

Entre o afeto e o excesso

Entre o afeto e o excesso

Por Mariana Baltar

    

Nesses tempos de imagens impactantes circulando pelas mídias (as alinhadas à construção da hegemônica do senso comum e as nem tanto assim) me lembrei de um conceito fundamental de Jane Gaines que diz respeito ao pathos da realidade (pathos of actuality). A pulsão passional das imagens do calor do momento, vistas e revistas. Da importância e impacto mobilizadores de sensações e sentimentos dessas imagens, da sua força bruta. Pensei também nos usos da repetição incessante dessas imagens, usos que me parecem cambiar como inserts entre o afeto e o excesso.

Tenho voltado minha atenção para esse universo que se move entre essas duas margens: a do afeto e a do excesso. Tomos esses termos (afeto e excesso) como elementos distintos mas que mobilizam a dimensão corporal/sensorial do espectador.
Se de um lado desse rio de mobilizações, a margem do afeto se vincula a ideia de performance, entendida como expressão que se ampara no corpo e para o corpo ultrapassando o desejo de representação – “Na representação, a repetição dá luz ao mesmo; na performance, cada repetição encena um único evento”, escreve Elena Del Río.

Do outro lado, localizo a margem do excesso como movimento em direção ao desejo simbolizador que também se dá no corpo, mas reforçando (ainda que roce o campo da performance, no caso predominantemente espetacular) e instaurando representações e projeções empáticas em umasuperdramatização de movimentos que expressam estados sensoriais e sentimentais que, dado a ver audiovisualmente, inspiram no espectador se não os mesmos estados, algo bem próximo (conforme é possível enxergar na tradição fundante dos gêneros do corpo, como aprendemos com Linda Williams).
No excesso, reinam performances reiterativas e saturadas que somam elementos (de efeito de imagem, de velocidade de cortes, de inserções musicais…) às imagens e aos sons na busca por compor símbolos que representem, que marquem, e ao fazê-lo, acabem por explicar e explicitar visões e narrações.

No afeto, impera o que quero chamar de uma dimensãoperformo-afetiva das personagens na relação/encontro com a câmera numa economia narrativa de elogio ao fragmento, ao instante, aos silêncios e às reticências, formando instantes de quadros que expressam mas não condensam explicitações ou explicações. Mas entre uma margem e outra, circula o turbilhão de encontros (usos e apropriações) entre o afeto e o excesso. As imagens brutas das cenas das ruas pelo Brasil usadas repetidamente nas diversas mídias me parecem andar por essa circulação. Carregando emoções e sensações, cuja pulsão passional vai sendo (re)enquadradas nas diferentes visões sobre as manifestações, sobre o estado de coisas.

Mais uma vez, me interessa o que está fluindo por entre tais margens.

Entre o afeto e o excesso

Ser sentimento e ser sensível

Por Mariana Baltar

Pensando alto enquanto retorno a História das Lágrimas de Anne Vincent-Buffault, antevejo o que poderíamos chamar de uma hierarquia do sensível estabelecida na passagem do século XVIII para o XIX. Personagens dessa hierarquia são, entre outros, Diderot e Senancour. Sobre esse último, a autora escreve: “fustigando severamente esta mania do sentimento, espécie de doença do fim do século XVIII, ele define-se claramente em um outro terreno. Ele diferencia aquilo que era frequentemente confundido, por exemplo em Diderot: a faculdade de enternecer-se e aquela de receber as sensações” (página 135). Ou seja, dissocia, eu diria, o sensível do sentimento, seccionando o lugar do sensível do excesso sentimental no século XIX. “O homem sensível deve preferir ao homem sentimental”, escreve Senancour. A partir daí, realmente uma peripécia na história das lágrimas; e essa personagem valorizada por ser pública, vistosa e ruidosa passa definitivamente a privada, contida e silenciosa. Acho que isso diz muito sobre o século XX, mas o que dirá sobre os tempos hipermodernos de hipertrofia espetaculosa do privado?

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